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Uma das mais tradicionais joalherias do país, a Monte Carlo, com cerca de 50 lojas, a maioria em shoppings, decidiu recorrer à Justiça para obter a redução de aluguéis que estão vencendo.
A justificativa é a seguinte: os contratos de locação têm como base para reajuste anual o IGP-M, que nos últimos 12 meses terminados em setembro, ficou negativo em 5,97%.
Se, durante a pandemia, os aluguéis subiram dois dígitos devido à disparada do índice, agora que o IGP-M caiu, segundo a rede, nada mais justo do que se beneficiar com a queda do valor da locação.
Nos últimos 12 meses terminados em agosto, a redução do índice foi ainda maior, de 7,2%. De janeiro a setembro deste ano, o IGP-M também acumula retração, de 4,3%.
“É uma questão de lógica. Se cai o índice, a correção tem de ser para baixo”, afirma Rodrigo Casaes, gestor jurídico da Monte Carlo. Em setembro, o IGP-M foi positivo em 0,37%.
Neste momento, a Monte Carlo, rede da família Balbi, que abriu a sua primeira loja no Rio de Janeiro em 1981, está entrando com cinco ações na Justiça.
Os shoppings envolvidos são Barra, Nova América e Tijuca, no Rio de Janeiro, Iguatemi Alphaville, em São Paulo, e Brasília Shopping, em Brasília (DF).
Casaes diz que a rede está disposta a acionar a Justiça no caso de outros shoppings na medida em que os contratos vencem e os centros comerciais se recusam a discutir a questão.
“Quando o IGPM bateu em 30%, os shoppings correram para aplicar o índice. Agora que o índice caiu, eles não querem reduzir o valor”, diz Daniel Cerveira, advogado da Monte Carlo.
CLÁUSULA
O fato é que na maioria dos contratos de locação entre lojistas e shoppings existe uma cláusula que diz o seguinte: o IGP-M será corrigido de acordo com a variação “positiva” do índice.
“Verificamos que, em quase todos os contratos, existe essa cláusula leonina que cita somente a variação ‘positiva’ do índice, não negativa, o que é flagrantemente ilegal”, diz Casaes.
A joalheria solicita nas ações o imediato afastamento da restrição contratual que impossibilita o reajuste deflacionário do aluguel.
“Nosso pedido é para que os locadores emitam os próximos boletos considerando a deflação apresentada pelo índice contratual a contar do último aniversário”, diz Cerveira.
Os shoppings já procurados, diz Cesaes, não aceitaram discutir o assunto, querem fazer valer o contrato. “A pandemia onerou demais os lojistas e é preciso corrigir essa ilegalidade.”
Os contratos de locação de lojistas e shoppings são, geralmente, de cinco anos, com reajustes anuais, de acordo com a Lei 8.245, de 1990.
“Se pensarmos num aluguel de R$ 10 mil, que não reduz para R$ 9 mil quando o índice cai 10%, o contrato vai sendo reajustado ano a ano sempre dentro da ilegalidade”, diz Casaes.
Cerveira afirma ainda que, quando os shoppings não reduzem o valor da locação em caso de queda do índice, eles acabam ganhando em cima de milhares de lojistas, uma prática chamada de “enriquecimento sem causa”.
“Isso ofende a ordem pública e provocará um grande impacto nos valores futuros de locação, inviabilizando milhares de negócios em todo o país, além de contribuir com a alta da inflação, na medida em que os comerciantes precisam repassar seus custos aos seus clientes”, diz.
Imagina quanto o shopping não ganha, diz ele, quando ele tem 300 lojas. “E o lojista que possui 50 lojas em shoppings perde muito dinheiro, se o índice negativo não é aplicado.”
Na ação contra o shopping Iguatemi Alphaville, o pedido é para a redução de aluguel a partir de agosto deste ano, que até então era de R$ 21.194,89.
Com a aplicação do índice, o corte no valor da locação seria de R$ 1.524,65. Isto é, o aluguel seria reduzido para R$ 19.559,93.
“Parece pouco, mas para quem tem muitas lojas, esse valor pode até comprometer a lucratividade de uma empresa”, afirma Cerveira.
Para ele, há outro ponto de distorção na relação entre os shoppings e os lojistas.
Os centros comerciais utilizam para os reajustes dos aluguéis os últimos 12 meses em que o índice foi positivo.
“O correto seria computar os últimos 24 meses, considerando o período negativo e o positivo”, diz.
A Monte Carlo não tem problema com os proprietários de imóveis localizados em ruas. “Esses contratos não possuem essa cláusula ilegal. Os donos dos imóveis estão aplicando o índice negativo”, diz Cesaes.
As ações judiciais podem se multiplicar, diz o advogado, na medida em que os shoppings se recusem a conversar sobre a aplicação negativa do índice.
“Se eles não toparem, vamos entrar com mais ações”, diz.
A Allos, empresa que nasceu da fusão da Aliansce Sonae e BRMalls, que administra o Shopping Tijuca, informa que não tem conhecimento do processo em questão e diz que os valores dos aluguéis são reajustados conforme os termos acordados em contrato.
As administradoras dos outros shoppings não responderam à solicitação da reportagem.
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